A presença digital pode ser determinante para o sucesso de um empreendimento. Nesse novo mundo para o marketing, o desafio é criar boas experiências para os consumidores, tanto nos computadores, como nos smartphones e tablets. De acordo com Ray Pun, líder estratégico para soluções mobile da Adobe, o tráfego dos aparelhos móveis já representa mais de 50% para algumas marcas, mas o investimento ainda é baixo.
Para ele, as companhias devem focar o desenvolvimento para celulares e tablets, não em sites para web que sejam apenas replicados nos aparelhos menores. E a “mina de ouro” é o desenvolvimento de aplicativos, que conseguem reter o cliente por mais tempo que a navegação pela web.
Em uma conversa durante o Adobe Summit, em Salt Lake City (EUA), Pun apontou também as oportunidades que o Brasil perderá com marketing digital durante a Copa do Mundo e a Olimpíada, caso não entenda o potencial de promover as competições pelos aparelhos móveis. Confira alguns trechos da entrevista:
O que mudou nos últimos anos para o marketing digital em aparelhos móveis?
Pun – Para os varejistas tradicionais, os consumidores passam muito mais tempo pesquisando os produtos nos smartphones ou tablets antes de ir à loja física. Especialmente nos Estados Unidos, quando alguém tem um tempo livre, pode estar procurando por um produto, que depois ele pode ir comprar na loja. No caso de lojas puramente digitais, e isso tem a ver com uma pesquisa que fizemos no ano passado, as empresas que vendem passagens e pacotes de viagem pelo smartphone ou tablet têm visto os clientes passando muito mais tempo em aplicativos no tablet, em comparação com o tempo que eles passam no site, no mesmo aparelho. Pesquisam a melhor passagem, hotel, local, e acabam comprando pelo tablet, até mesmo pelo smartphone. É uma mudança grande também, porque antes dos aparelhos móveis tudo passava pelo PC. Pelo mobile, a empresa pode mostrar ofertas de quartos para hoje a noite em determinada cidade, o que deixa tudo mais em tempo real.
E o que não mudou ainda, mas já deveria ter mudado?
Pun – O que não mudou ainda é o fato de que, embora o tráfego móvel para muitas marcas já ultrapassou os 50%, o investimento em aparelhos móveis continua relativamente baixo à web tradicional. Muitas empresas ainda estão focando sua infraestrutura para internet de 1999. Agora já é 2014. Aquela infraestrutura não foi atualizada para atender as expectativas do consumidor de smartphones e tablets. Eles querem boas experiências. Pode ser primeiro na web tradicional, para conhecer a marca, mas depois que se torna cliente, ele quer também boas experiências em aparelhos móveis. Não quer ficar restringido quanto ao canal em que é possível entrar em contato com a empresa. Muitos analistas já apontaram que o investimento em mobile está muito abaixo do investimento na web e do engajamento que os consumidores têm por estes aparelhos.
O que você diria então para uma empresa que está montando agora sua estratégia para aparelhos móveis?
Pun – A chave para uma estratégia mobile é pensar primeiro no valor que está gerando para o consumidor. É muito diferente do que na web tradicional, porque há muitas possibilidades. Há localização por GPS, a possibilidade de mandar um SMS ou mensagem por push, a habilidade para prover uma experiência personalizada com base em comportamentos. Localização, tempo real e comportamento, tudo isso se une no mobile. Então que valores você pode fornecer? Primeiro uma usabilidade muito fácil. Fizemos uma pesquisa no ano passado com 3 mil consumidores, perguntando o que diriam para as empresas de mídia, varejo e financeiras com as quais eles têm contato online. Eles disseram: façam com que a experiência seja mais simples, mais rápida e segura, em caso de produtos financeiros.
E as empresas não estão entregando isto?
Pun – Não. Algumas vezes entro no site de uma empresa pelo celular e tenho que preencher um formulário, uma série de questões – esta é uma experiência de desktop, não de mobile. Para mim, valor em aparelhos móveis vem de três dimensões. O primeiro é facilidade para usar. O segundo é “me ajude a poupar dinheiro”. Quero receber ofertas em tempo real, cupons e descontos no telefone, que eu mostre no caixa e pronto. A última coisa é, mais do que ser simples, promover uma experiência impressionante, que me leva a amar a marca. Há um aplicativo chamado Uber, que te ajuda a achar um táxi em Nova York, ou São Francisco.
Temos alguns parecidos em São Paulo…
Pun – Então, vocês sabem como pode ser difícil achar um táxi em cidades grandes. Estava em Nova York no ano passado, chamei um táxi pelo aplicativo, ele chegou, meu cartão de crédito estava registrado no app, eu saio do táxi e não preciso dar dinheiro algum.
Ainda não chegamos neste ponto…
Pun – Quando chegarem, você vai dizer “wow”! Eu não gosto de andar com dinheiro, para mim é incrível. Vou usar sempre o aplicativo em cidades grandes. Esse é o tipo de valor que o marketing precisa pensar, como fazer do meu aplicativo um valor tão bom que ele se torna uma utilidade, para se usar o tempo inteiro.
Você citou anteriormente uma pesquisa com apps e páginas mobile. Essa empresa que está começando agora, deve se focar em aplicativos então?
Pun – Depende do objetivo da empresa. Se o seu alvo é atingir novos consumidores, então é página mobile. Cada URL vai levar o consumidor para lá. Você precisa ter uma presença mobile, pelo menos páginas iniciais. Mas a partir daí, os aplicativos são o canal de engajamento. Quando alguém diz, eu gosto de você, quero fazer negócios com você, ele prefere o aplicativo, porque precisa ser algo rápido. No Brasil vocês têm pacotes de dados limitados, então podem baixar o app no wifi, e depois não precisa mais ficar carregando páginas. Está tudo lá. Se você pensar no valor, na simplicidade, na economia, as pessoas podem passar muito tempo nele, o que levará à monetização. Então você precisa ter os dois canais, pelo menos o básico da página mobile, e de lá mostrar ao consumidor que ele pode baixar o aplicativo.
Então o aplicativo é mais indicado para conversões (de compras)?
Pun – Ele é mais indicado para quando você quer que o cliente passe mais tempo em contato. No caso de meios de comunicação, isto significa mais publicidade, e mais dinheiro. No caso de comércio eletrônico, pode levar ao fechamento de compras, mas as pessoas também podem ir às lojas. Em geral, o tempo gasto é bom. O único caso em que não é bom, é quando você passa o tempo preenchendo um formulário.
Quanto tempo levará para vermos anúncios 100% personalizados?
Pun – Acredito que a tecnologia já está aí. O que determinará isto é a maturidade das empresas, quanto ao que elas entendem por personalização, quais dados vão coletar dos consumidores e como elas usarão esses dados para chegar a esta experiência. Muitos profissionais de marketing não entendem ainda os dados de comportamento, localização, tudo está disponível. Então, cabe à empresa decidir a partir dos dados: qual é a mensagem que vou entregar? Temos uma ferramenta que mostra o perfil do usuário em diversos canais, então o marketing pode decidir se manda um e-mail, um SMS.
Sabemos que os consumidores deixam muitas informações que podem ser coletadas. No futuro, todos os nossos passos serão monitorados. Isto é verdade?
Pun – Não é necessariamente verdade. Cada empresa decidirá o que fazer com os dados que eles coletam. A nosa recomendação a todos os cliente Adobe é de que os dados coletados são o que você é, como marketing. Então você faz um acordo de privacidade com seu cliente: estas são as informações que nós coletamos e isto é o que faremos com elas. Se você for vender essas informações para terceiro, você precisa informar o consumidor. A questão é quando as informações são vendidas e o consumidor nem sabe disso, não tem o controle sobre isso. O marketing precisa trabalhar mais próximo à parte jurídica. Estes acordos precisam ser fáceis de compreender e claros sobre o que farão com os dados.
Lembrei-me de um livro que li. No futuro, as ruas teriam postes digitais que mostram quanto crédito dispõe a pessoa que está passando embaixo. Imagino que em um futuro próximo, as empresas saberão quanto crédito tem a pessoa que acaba de entrar na loja…
Pun – Acredito que existe um potencial. De um ponto de vista da personalização, temos a tecnologia hoje do iBeacon, que permite a loja saber quem é a pessoa que está entrando na loja com o smartphone. Se eu sou um cliente leal da loja, eles devem saber disso, devem saber as coisas que gosto de comprar. E quando entro na loja, eles podem me direcionar corretamente. Esse tipo de personalização é boa, para mim. Mas tornar isso publicamente visível é um pouco estranho. Se for somente entre mim e a empresa, é interessante porque não fico perdido na loja, sem saber o que está em oferta, procurando…
Como manter a privacidade então?
Pun – Com práticas simples. Primeiro, como marketing digital, você precisa dizer o que você fará. Em segundo, o time precisa cumprir o que disse. Se vai coletar somente localização por GPS, não pegue também minha lista de contatos. E por último, simplifique a opção para o cliente optar por não compartilhar os dados. Se você seguir isto, na grande maioria dos países vai estar tudo bem. Mas nunca poderemos controlar o que os governos decidem sobre privacidade, que é algo que eles sempre tornam um “problema”.
Fora os governos, as pessoas não se preocupam com a própria privacidade? Elas aceitam compartilhar tudo?
Pun – Para todo consumidor que escolhe não compartilhar seus dados, ele pode fazer isto, mas eu pergunto: você usa a Amazon.com? Toda vez que eu entro vejo uma lista de recomendações. Você quer entrar na Amazon e não ter nenhuma recomenação, apenas uma lista de categorias intermináveis, entrar em cada uma e procurar o que quer. A maioria das pessoas responderá: não, isso é meio frustrante. Se você der às pessoas essa contrapartida lógica, acho que a maioria vai concordar. Algumas pessoas ainda vão negar, mas estas são exatamente as pessoas que não usam internet ou aparelhos móveis para compras, elas simplesmente vão à loja e pagam em dinheiro.
O Brasil sediará neste ano a Copa do Mundo e a Olimpíada em 2016. Quais são as oportunidades de marketing para o País nestes eventos internacionais?
Pun – Acredito que a primeira experiência no smartphone é um momento crítico para qualquer marca. Para toda promoção, campanha, garanta que ela funcione nos aparelhos móveis também. Se você levar o consumidor do smartphone para uma página inicial desenhada para o desktop, é uma decisão ruim. A pessoa sairá logo e nunca mais voltará. Então pensar primeiro nos aparelhos móveis e atrelar a campanha aos locais de jogos pode ser uma oportunidade. Por exemplo, em alguns jogos de beisebol nos EUA, quando a pessoa chega ao estádio recebe uma mensagem de boas vindas, o ingresso já está no telefone e pode ser escaneado para entrar, e aparece um mapa mostrando onde está seu assento. Durante a partida, pode receber uma mensagem dizendo que a cerveja está em oferta. Nestes eventos grandes, isso pode provocar uma boa experiência, principalmente em turistas. Não acredito que isso possa ser adotado para a Copa, mas talvez para a Olimpíada.
No Brasil, a maioria dos sites de mobile são simplesmente um espelho do desktop, isto é muitas vezes frustrante…
Pun – Não pegue apenas o conteúdo do desktop e coloque nos aparelhos móveis. Esta é a saída fácil. Você precisa entregar valor. Às vezes me surpreendo com o marketing, vocês não usam seus próprios sites? Principalmente nos aplicativos, os usuários deixam resenhas: “o app está com pau”. Antes dos aplicativos, as pessoas não reclamavam, no máximo diziam que era lento. Mas nas App Stores isto é tão visível. Eles dão apenas “uma estrela”, dizem que é ruim, não funciona. Você precisa levar isso a sério. Se não fizer, outra pessoa fará. Perceberá todas essas experiências ruins e fará algo melhor. Vai pesquisar outras marcas de sucesso no mobile e ver o que é possível fazer. O grande problema é jogar o conteúdo do PC para os aparelhos móveis, mas nos tablets é que está a maior oportunidade.
Fonte: Terra